(*) Burning Sky - Belo Horizonte/MG - Photo, Art: Ana.
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12 fevereiro 2008

Concreto em flor

Saudade não se fabrica, saudade é presente no ausente, é constante, é cheio de vazio. Não é feita de tijolos de lembranças, nem de pingos de suor. É de pedras no meio do caminho, de poeira de sol, de estrelas no céu, de conta-gotas de mar. Saudade é concreta, saudade é companheira. É coisa, palpável, não se lava, se carrega consigo, como uma roupa que nunca se despe.

De vez em quando a saudade te engana, diz que vai embora. Aí fica escondida atrás da porta, só te esperando voltar da rua, pra te ver nua e exausta e frágil e sem graça. Te assusta quando te toma de assalto, pula em frente e te rouba tudo o que é mais seguro. Invade sua bolsa de pele humana, e te torna menos gente do que já é. Explode em sua cara santa um sorriso sarcástico, te nega, te condena, te oprime. É amiga dos minutos, daqueles em que não se tem nada pra fazer. É silenciosa no chegar e alarmante no ficar. É bicho, renegado, nunca se vê mas sempre te segue como uma sombra na penumbra.

Nunca vai embora? Nunca se supre? Não se substitui? Apenas permanece ali, perene, quieta, latente. Enchente nos períodos de pororoca emocional, chuvas intermitentes que assolam a região do pensar, o vale do sonhar, e o norte do estado do vagar. Até que vem a seca que te resseca por dentro, te suga as energias todas e te fazem sucumbir a ela, a saudade, novamente.

Um broto verde surge em meio à lama do rio seco. Um fio de teia de aranha se enfeita de orvalho, como um colar de pérolas no colo de uma moça da realeza. E a libélula pisca os olhos – se é que libélulas piscam os olhos – e se lembra que viver é sofrer, viver é doer, é sentir, é sonhar, é morrer a cada segundo e ressuscitar no instante seguinte ao inspirar perfume de gardênias, mel em flor e baunilha fresca!

Peço licença aos meus devaneios e me pego a caminhar por entre praças, ruas e carros. Algumas buzinas e gotas da chuva que já vem. Nem me importo. Estou na chuva é pra me molhar.
Ana.